sexta-feira, 27 de abril de 2012

Esvaindo...

Estou com fome! Ainda bem que deixei comida pronta. Quando chegar em casa boto no microondas e pronto. Enquanto isso, tomo um banho quente. Estou exausta! Graças a deus não trabalho amanhã. Vou poder descansar um pouco. Nossa! Já são quase onze da noite e esse ônibus não anda... Finalmente! Quando vou poder comprar um carro pra me livrar disso? Ter que aprender a dirigir vai ser terrível!
E assim ela desceu do ônibus e caminhou como de costume em direção à sua casa. Tudo como sempre, até que algo estranho a despertou daquela rotina. Não sabia exatamente o que era. Uma sensação esquisita. Olhou várias vezes para trás procurando se havia alguém lhe seguindo. A rua estava deserta. Na verdade, preferia que tivesse alguém, não lhe seguindo, mas alguém. Tentou voltar aos seu pensamentos normais. “Esses saltos me matam!” Mas agora sentia medo. Percebeu com espanto que seu coração estava mais acelerado que o normal. Pequenos pontos começaram a brilhar em seu rosto. Transpirava, mas não sentia calor. Sentiu que deveria apressar o passo. Quase pôde ouvir outros passos. Suas pernas tremeram e seu estômago encolheu, fazendo com que involuntariamente diminuísse o ritmo da caminhada. Estava ficando doente? Mas... doente de quê? Estava alucinando? Não! Tinha certeza que algo de mal se aproximava dela. Como num pesadelo, tentava andar mais rápido, mas suas pernas ficavam cada vez mais pesadas. Ofegava pelo esforço. Pensou em telefonar para alguém, para a polícia, mas suas mãos já estavam ocupadas apoiadas nos muros para ajudar a andar. Já não enxergava com tanta clareza. Uma manto pesado, escuro e denso parecia ter se derramado sobre ela, enquanto se debatia para não sufocar. O que queriam dela? Por que esperavam? Por que se escondiam? Ela já era um alvo fácil demais e ainda não tinha sido abordada. Não olhava mais pra trás porque tinha certeza que seja lá quem ou o que fosse poderia alcançá-la a qualquer momento. Teve a impressão de ouvir sussurros e parou na esquina seguinte para tirar os sapatos. Ficou estarrecida e ainda mais aflita quando percebeu que de alguma forma pegou o caminho errado. Como era possível?! Não entrou em nenhuma rua diferente, mas definitivamente daquela esquina em diante não era o caminho de sua casa. Agora ela já recusava terminantemente olhar para trás. O que fazer? Esperar? Como chegar em casa por essas ruas que ela nunca viu? Seu corpo, cada vez mais pesado e invertebrado não quer se mover.  Não tinha mais forças. A escuridão aumentava e ela sentia como se escorresse pelo ralo. Desmanchava-se como manteiga ao calor. Fez-se em mil pedaços quando algo pareceu cair sobre ela. Sentiu-se fragmentada e espalhada, cacos de todas as formas, irregulares. Podia sentir o espaço entre cada pedaço e sabia que cada um deles era ela. Foi soprada para alguma direção que não podia mais ver. Juntaram-se-lhe mil outros pedaços e ela já não sabia mais quem era, quantos eram, o que é ser. Não era mais. Não tinha mais peso, não tinha mais medo, não tinha mais dor, não tinha nada. Não tinha sequer o vazio, a solidão ou qualquer necessidade explicação ou justificação. Ela não era mais, não estava mais, não pensava mais, não se sabia mais. Apenas... sabia!