quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Não Há

E eu vou seguindo os meus pés
Por onde eu já não sei andar
Não dá para chorar a solidão
Quando se vive sozinho ao relento
Eu não aguento tanta luz ao meu redor
E o pior é que o tempo já passou
Lançou os sonhos no passado
Calados, sombrios, vãos
De vez em quando quase sempre fico só
Só apareço quando me convém
Não vem ninguém ao meu socorro
E se eu corro é pra não ser visto
Eu insisto: não estou aqui

Com os meus olhos não vejo
Além da minha consciência
E essa ausência é só uma luz que ainda não apagou
Levei um tempo pra entender
Que tender pra essa direção
É tão perigoso quanto inevitável
Não é amável o que ao destino ofereço
Desço à rua a passos lentos
Sonolentos são esses dias tristes
Mas existem as noites cheias de quebranto
Por isso eu canto tanto quanto posso viver
Pois que não há outro sentido
Então eu sigo, eu digo: ninguém fica aqui

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Anoitecendo

A noite acorda sonolenta
Traz os olhos rasos d’água
Levanta triste e quente
Pronta pra chover
A menina apressa o passo
Outra vez quer tentar escapar
O incauto afrouxa sua gravata
Enquanto espera a sua vez
Perto dali, longe e indiferente
O senhor enxuga a testa
Está pesado e contente
Seu banquete ainda vai durar
Ninguém reclama das luzes ácidas
Que querem impedir a noite entrar
Ela se ergue e se estende
Abafando cores e lamentos
O profeta hasteia seu arpão
E o louco grita de terror
Calam solenes as ruas
O céu desaba a conta-gotas
Numa melodia suave e constante
Condoída e sorridente
As hostes de sedentos ululam
Trôpegos, amigáveis, virulentos
Ganidos e sussurros vagueiam
Pecados e mendigos despertam
A noite socorre e alenta
Quem já não tem inocência
Desnuda e santifica
Quem sobreviveu nos escombros
Suave e cortante
Sua pena é fatal

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Olhos de Luz

E essa sua luz
Que me seduz
Que me conduz
Ao infinito
E seus lábios
Doces, tenros
Paraíso e pecado
Silenciam o passado
E seus olhos mais que estrelas
Inflamam com suas centelhas.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Deixe

Deixe-me longe
Deixe-me aqui
Sigo a estrada esquecida
Não me procure no retrovisor
Não pergunte
Não ouça
Deixe-me tanto quanto for possível
Deixe-me só
Só o pó da estrada
E os ossos revirados pelo cão que vadia
Vá dias à frente
E não veja o tempo passar
Não espere remissão
Não existe perdão no esquecimento
Cimento sepulta meus passos
Não há pegadas
Não há sentido ou razão
Deixe-me fora
Dos espaços, dos compassos
Fora de questão
Os que estão à sombra
Podem fartar-se
Afastar-se da distância velada
Vela da proa sem vento
Vem tua brisa soprar anseios
Nos seios da calma morte.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Indo...

Mais um passo no abismo.
Não é o topo do penhasco.
É o lugar mais baixo.
É preciso galgá-lo novamente
Para do alto outra vez atirar-se.
Juntar os pedaços e seguir sem esperança.
Contar com o improvável sem esperá-lo.
Seguir fragmentado pra viver por inteiro.
Não subir o monte é morrer-se.
Não se jogar é tão ruim quanto esses versos.
Sem inspiração.
Prisão.
Condenar-se.

domingo, 26 de junho de 2011

Números

Há algum tempo recebi um e-mail assombrado com as datas que veríamos neste ano. 1/1/11, 11/1/11, 11/11/11 e 1/11/11. Eu ainda acrescentaria 20/11/2011. O espantado e-mail perguntava pela explicação dessa coisa apocalíptica. Eis minha resposta:

É fácil explicar. Nosso sistema numérico é o decimal, ou seja, utilizamos apenas DEZ caracteres para representar todos os números. Então, depois de algum tempo, na sucessão normal da combinação entre os caracteres haverá pares ordenados e combinações que nos farão lembrar números e coisas que já conhecemos. O mundo não vai acabar porque o odômetro do seu carro vai marcar 111111 quilômetros rodados. Você não é a besta-fera porque recebeu um número de inscrição ou na certidão de nascimento 666 ou 111111. Num país com quase duzentos milhões de habitantes, alguém vai receber uma numeração 66666. Também não se espante se esse for o milésimo centésimo décimo primeiro e-mail na sua caixa de entrada. Os números sempre se repetiram e assim continuarão. E as superstições baseadas nas conincidências numéricas também.